Posted by : Unknown domingo, 18 de março de 2012


Eu estava querendo escrever sobre algo recente que eu tivesse acabado de ler. É mais prático e tudo ainda está fresquinho na memoria, pronto para passar para o papel. Com isso, recentemente eu peguei pra ler um clássico, para dar continuidade a minha série de postagens sobre mangás clássicos. Por mais que o novo soe “melhor”, eu defendo que todo fã de yuri deva conhecer um pouco mais das origens do gênero e acaba que independentemente da obra em questão ser boa ou não, ela é um excelente material de estudo, sobre um época. Então, acabei pegando pensadamente para ler, Maya no Souretsu (Maya's Funeral Procession), da mangaka Yukari Ichijo, publicado originalmente em 1972, um ano após Shiroi Heya no Futari (este que é datado como o primeiro mangá yuri a ser publicado).

E o que eu posso dizer? A história é fraquíssima, como não poderia deixar de ser, uma vez que para os padrões atuais, muitas coisas ali soam obvias demais e o fim da história, já se nota desde o primeiro capitulo. Por isso eu me pergunto se realmente é válido julgar Maya no Souretsu (ou qualquer outro clássico antigo), com os olhos críticos atuais, afinal, mesmo diante de um hit como o mangá sensação do momento, Prism, este parece conter ainda mais personalidade. Algo que o diferencia de muitos. O curioso é que a execução do roteiro de Maya no Souretsu é tão afiada, que você simplesmente devora todo o capitulo initerruptamente. E bem, é um mangá shoujo de 1972 – Como comentei na resenha de Claudine...!, os mangás destinados ao público feminino nessa época, tinham um tendência a serem bem mais melodramáticos. Acredito eu que muitas series, colocam as novelas mexicanas facinho no bolso, inclusive. Muitos, principalmente os homens, chamam isso de recursos baratos de roteiro, ao apelar para as lágrimas fáceis. Mas foi um momento conturbado, principalmente para a classe feminina. Fora que o fator emocional, sempre foi algo bem característico nosso, embora eu considere isso algo que independe de gêneros demográficos.



De qualquer forma, é algo que eu adoro. Principalmente se for um melodrama bem executado. Ou pode ser tosco também, desde que dê para rir. Maya no Souretsu é um shoujo com uma temática bem sombria. É classificado como terror psicológico, mas não espere imagens assustadoras ou algo do tipo. Na verdade, o terror se dá de forma implícita, na reação dos personagens a determinado fato ocorrido. Mas possui uma boa tensão psicológica e reviravoltas interessantes, embora algumas já fossem esperadas. A história começa com a personagem principal, Reina, e sua família, que vão passar as férias na casa de verão. Mas estranhos incidentes começam a ocorrer, como pessoas morrendo uma a uma e até animais de estimação viraram alvo de fúria de alguém. Em meio a tudo isso, Reina conhece a personagem título da nossa história, Maya, e fica completamente e instantaneamente (!!!) encantada pela misteriosa vizinha. Acontece que Maya está sempre vestindo roupas longas e escuras, e parece carregar uma dor imensa em seus olhos. Além do vasto conhecimento que demonstra ter sobre a família de Reina.

Bom, eu quero acreditar que mesmo que você não tenha lido, já imagine quem está por trás de tudo isso. Mas a grande questão nem é essa, mas sim, por quê? A Yukari Ichijo tem astucia, pois num mar de obviedade, ela ainda consegue surpreender com reviravoltas peculiares, assim como manter uma linha narrativa que consegue prender a atenção, por ser envolvente. Um ponto em que se nota uma certa forçada de barra, é no que diz respeito ao relacionamento entre Maya e Reina. Tudo bem paixão a primeira vista, mas faltou um desenvolvimento entre elas, que justificasse a intempestiva paixão que Reina sente por ela, quase que instantaneamente. Claro que não havia muito tempo disponível para isso, mas de toda a história, isso é algo que incomoda um pouco, uma vez que você não consegue sentir afeição por nenhuma das duas.





O fim é aquele de sempre: TRÁGICO! Fiquei com um certo nó na garganta, porque sou um pouquinho feminista e não consigo engolir bem certas resignações do universo feminino. Mas o melodrama é excelente. Não vai te fazer chorar, mas em alguns momentos você talvez sinta vontade de rir. É divertidamente OOOOOOVEEER MELO-DRAMATICO!!! O Yuri não é o forte aqui. Cai bem para o que conhecemos aqui no ocidente como shoujo-ai. E como tal, é muito bonitinho, principalmente porque a Reina é bem novinha e a Maya é um pouco mais velha. Digamos que a Reina tenha 14 anos e a Maya, lá com seus 18 (eu sei que yurifags tem fetiche com isso). E tem algo a mais, que eu prefiro não revelar, pra não estragar a experiência dos possíveis interessados no mangá.

Em 2005, Maya no Souretsu foi relançado pela Shueisha em um volume encadernado, trazendo junto mais 2 histórias. Ambas foram publicadas nos anos 70 na lendária revista shoujo, Ribon. Além da história de Maya e Reina, que contém incríveis 258 páginas em um único capitulo, temos "Otouto" (Little Brother) e "Kurisuchiina no aoi sora" (Christina's blue sky), mas com exceção da primeira nenhum das outras duas tem insinuações de shoujo-ai, portanto não há motivo para comenta-las. Outro ponto interessante nessa série, é que a Ichijo se viu amplamente influenciada pelo mestre Osamu Tezuka, algo notável pela presença de ilustrações que se assemelham às Xilogravuras. Mas se nota uma evolução do tipo de traçado que ficaria bem popular no fim dos anos 70 e anos 80. Algo mais arredondado, olhões brilhantes e expressões de choque. Para a época, o estilo de arte da Ichigo é sensacional. Os personagens agem como fantasmas e isso fica bem nítido para o leitor, com suas expressões tão dramatizadas, que mais lembram atores de uma peça teatral. Maya no Souretsu é um mangá que você vai se encantar ou ficar horrorizado pelo exagero dramático, mas de recomendável leitura. Principalmente, porque pra época, uma história tão sombria e envolvendo um amor proibido entre duas meninas, deve ter dado o que falar. Obviamente, com a cultura do Japão, onde o romance e/ou encanto entre/por mulheres é permitido até certo ponto/idade, o mangá se encerra de uma forma em que a mensagem é intrinsecamente clara: Você pode se encantar e até se envolver com outra garota, mas no fim das contas, você vai se casar com um homem e constituir uma família. 


Autora: Yukari Ichijo
Ano: 1972
Editora: Shueisha
Revista: Ribon
Demografia: Shoujo
Gênero: Tragédia, Shoujo-ai, Drama, Romance, Horror
Onde encontrar: Aino Scanlation

3 Responses so far.

  1. Olha só, foi perguntar no post anterior, e a Roberta apareceu...
    Maya's Funeral Procession foi uma leitura interessante, e acho que o melodrama não deprecia a história, apesar de exagerado. Também não gosto dessas "resignações do universo feminino", segundo quem me conhece, sou um feminista, então acho que isso contribui para essa opinião (embora "feminista" seja exagero, apenas tenho um ponto de vista menos convencional sobre as interações sociais...)
    Adorei esse post, e concordo que não se deve julgar os clássicos baseado nas obras atuais, é preciso contextualizar. Continuem com o bom trabalho, vocês do KaS, e até logo!
    Nota: As duas cenas de beijo (entre Maya e Reina, e o beijo de Reina nas feridas de Maya) foram lindas, achei a arte de Yukari Ichijo bonita, mesmo com esse traço simples, característico da época...

  2. Desculpe, mas o meu nome "linkou" errado, esqueci de por uma coisinha...

    Sumimasen!

  3. Esses mangás antigos, as vezes não são interessantes por si próprios e sim mais por você ver a idéia que o autor passou em relação ao tratamento que se dava ao yuri na época, dá pra se notar isso pelos infinitos finais trágicos desses mangás antigos.

    Acho que embora seja trágico, o fato de haver uma insistência no amor quehá no shoujo-ai, torne isso mais bonito ainda.

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