Posted by : LKMazaki terça-feira, 23 de setembro de 2014

Olá a todos! Cá estamos mais uma vez, agora trazendo a quarta parte da história de Clarisse a Alex (que já está bem mais para minissérie do que para contos, vamos concordar). Gostaria, antes de mais nada, de deixar meu agradecimento a todos os que tem acompanhado esta singela história.

Nesta parte a trama vai começar a entrar em seu momento de tensão mais evidente, ainda que esta presente parte seja apenas o início dessa reviravolta para a trama das duas antigas colegas que nunca confessaram a paixão mútua que sentiam.

Fragilidade. . . Esse título já diz muito sobre o enredo.

Boa leitura a todos! Como sempre, críticas e comentários são sempre bem vindos. Tentaremos sempre melhorar dentro do possível e plausível.



Fragilidade
por Lilian Kate Mazaki


O clima estava ótimo na tarde daquele sábado. Para Clarisse tudo parecia ainda melhor agora que enfim a edição especial de final de ano estava encerrada e encaminhada para a gráfica. Qualquer encrenca agora iria ser tratada apenas pelo departamento de diagramação, não mais edição, então ela poderia enfim respirar e voltar a desfrutar da sua rotina mais calma. A redatora chegava a sentir-se um tanto perdida enquanto caminhava despreocupada por um lado da cidade pouco conhecido seu, de repente livre de todas as pressões de antes. Uma paz não tão verdadeira, pois desaparecia cada vez que ela se recordava do que a levara àquela avenida.
Não demorou muito para avistar o discreto letreiro próximo a uma movimentada esquina. Lia-se "Vintage - Cafeteria" e ela teve certeza de ter encontrado o local correto. A fachada, com textura de madeira e vidros escurecidos não poderia ser encontrada duas vezes naquelas redondezas, tinha certeza. Quando entrou o badalar da pequena sineta à porta misturou-se ao som ambiente, um jazz distante, imergindo seus sentidos de imediato ao clima do estabelecimento.
― Boa tarde, seja bem vinda. ― cumprimentou uma mulher jovem do outro lado do balcão também bem caracterizado.
― Olá, boa tarde. ― respondeu Clarisse. ― Por acaso saberia me dizer se tem alguém me aguardando? Meu nome é Clarisse.
― Oh, claro. ― afirmou a garçonete, abrindo um sorriso mais natural. ― Uma moça está aguardando sua chegada a uma meia hora, mais ou menos. Pode subir as escadas, ela está em uma mesa ao fundo. Logo irei até vocês para anotar seus pedidos.
― Está bem. Obrigada. ― agradeceu Clarisse, dirigindo-se às escadas indicadas pela funcionária.
O segundo piso do estabelecimento era bastante comprido, tomado por diversas mesinhas quadradas e alguns televisores nos cantos das paredes. Imagens do que parecia um filme dos anos 70 eram exibidos nas telas, sem áudio. Não foi difícil encontrar Alex, pois ela era a única ali, sentada de lado para a entrada, distraída com um tablet. O nervosismo borbulhou no estômago de Clarisse nos segundos que levou para alcançar a mesa:
― Alex? ― chamou, incerta.
― Hm? Ah, Clarisse! ― exclamou a fotógrafa, despertando da imagem no seu portátil. ― Senta, eu só estava terminando de checar uns e-mails de uns freelas aí. ― explicou.
― Ah sim. ― disse Clarisse, sentando-se de frente para a outra.
Logo a garçonete apareceu para anotar os pedidos. Clarisse pediu um capuccino sem teçer comentários, já Alex fez questão de comentar como ouvira falar daquele lugar:
― Sabe, foi uma amiga que me indicou este lugar. Ela me disse que sempre vem aqui no meio da semana. ― disse enquanto vasculhava o cardápio.
― É mesmo? Ficamos sempre felizes em ver nossos clientes falando sobre o "Vintage" para seus conhecidos. ― comentou a garçonete que chamava-se Suzie. ― Espero que vocês gostem e também se tornem nossas frequesas regulares. Temos algumas programações especiais nas noites de sexta. Depois trago os folders para vocês.
― Obrigada, Suzie. ― agradeceu Clarisse.
― Sei que vamos gostar. A Jenifer tem um ótimo gosto. ― disse Alex, devolvendo o cardápio. ― Eu vou querer uma soda natural, por favor.
― S-Soda? Claro, já trago o pedido de vocês. ― disse a garçonete saindo apressada. Teria sido impressão de Clarisse ou algo a tinha incomodado?
― Então essa é a Suzie. . . ― comentou Alex.
― Você já a conhecia? ― perguntou Clarisse, intrigada.
― Não. É que a Jenifer disse que estava tentando convidar "a Suzie do Vintage" para sair. ― explicou Alex, com um sorriso de divertimento, ainda fintando o local onde a outra desaparecera para o andar inferior.
― Ah. . . ― Clarisse tentou não parecer tão surpresa quanto realmente ficou ao ouvir aquele comentário.
Clarisse acabou perdendo boa parte da sua parca capacidade de tomar iniciativa durante os minutos em que as duas esperaram suas bebidas. Depois de servidas e novamente sozinhas foi Alex quem resolveu quebrar aquele silêncio precoce:
― Então, aliviada com o final da edição? ― perguntou a fotógrafa.
― Sim. ― respondeu Clarisse, mas percebendo que iria soar muito seca se só dissesse aquilo emendou. ― Mais uma semana e acho que teria um colapso.
Alex riu do comentário:
― Acredito. Foi a primeira vez que fez esse tipo de trabalho como assistente direta do editor-chefe, não?
― Sim, foi inesperado.
― O Valter parece um tiozinho bacana, mas deve saber ser chato quando os prazos são curtos. ― supôs Alex, franzindo a testa e voltando os olhos para o alto, numa guisa cômica de reflexão que arrancou uma risada da outra.
A conversa das duas começou a fluir melhor conforme foram esvaziando suas bebidas. Logo várias histórias cômicas da faculdade surgiram para fazê-las esquecer a seriedade. Não havia como manter a compostura quando diversas confusões envolvendos as duas e Ricardo, geralmente impulsionadas pelo álcool, eram relembradas. A certo ponto Clarisse sentiu que poderia mudar um pouco o foco da conversa:
― Então, como foram esses anos fora? ― perguntou ela.
― Ah. . . ― começou Alex, parecendo buscar a melhor maneira de se expressar. ― Acho que posso resumir dizendo que foi tudo o que eu precisava. ― disse.
― Dizem que passar um tempo longe de casa nos faz amadurecer. ― comentou Clarisse.
― Por aí. ― concordou a fotógrafa. ― Digamos que eu precisava de espaço para me descobrir e me entender.
― É mesmo?
― Uhum. Logo que cheguei lá conheci a Jenifer e, bom, ela me deu uma grande ajuda, podemos dizer. ― disse Alex, com um tom sugestivo.
― Vocês duas. . .
― Sempre tivemos uma amizade colorida, se é isso que quer saber, Clari. — disse a morena, sem meias palavras. ― Não que ela tenha sido a única. Fomos juntas a muitas festas lgbt nas cidades vizinhas e eu conheci muita gente.
― Ah sim. ― disse Clarisse, desconfortável.
― O Ricardo nunca te convidou para alguma festa dessas? ― perguntou Alex.
― Algumas vezes, mas nunca aconteceu de eu ir mesmo. ― respondeu Clarisse, encarando a taça de capuccino com mais dedicação do que o necessário.
― Hm. . .
Clarisse sentiu toda a sua coragem esvair com aquele rumo de conversa. Alex percebeu com clareza o que passava com a outra, mas não tinha mais a paciência de outrora para fazer um movimento de recuo. Ao invés disso ela decidiu seguir com a conversa para onde realmente queria chegar:
― Sabe, às vezes eu paro para pensar como tería sido se eu não tivesse me mudado. ― disse, sem tirar os olhos da outra, que parecia agora decidida a observar a decoração ao invés de retribuir-lhe.
― É uma dúvida que nunca poderemos esclarecer, não é mesmo? ― falou Clarisse.
― Verdade. ― concordou Alex, a voz um pouco mais rígida do que gostaria. ― Mas agora temos a chance de saber o que acontecerá agora que voltei.
Clarisse engoliu saliva e umideceu os lábios:
― Não sei se quero saber, na verdade. ― disse, enfim encarando de volta a outra. Alex ergueu as sobrancelhas.
― Como assim?
― É que. . . ― começou a jornalista, ansiosa. ― Me assusta um pouco, depois de todos esses anos, pensar em reviver algumas coisas que nunca fui capaz de entender.
Era aquilo, pensou Alex. Estava enfim falando do que de fato havia as trazido até ali. A fotógrafa não esperava ouvir algo tão sincero assim da outra, mas não iria perder o foco:
― Você é do tipo de pessoa que prefere ficar sempre presa ao que já entende? ― perguntou.
― Talvez. ― confessou Clarisse, desviando o olhar para o restante do seu capuccino. ― Se eu não fosse tão covarde não teria ficado aqui todo esse tempo.
― Como assim? ― perguntou Alex pela segunda vez, novamente surpresa.
― Logo que eu e o Ricardo entramos na editora surgiu uma vaga no interior. Eu queria ter aceitado aquela vaga. Pensei em como você ficaria surpresa quando me visse. Mas então. . . Eu me acovardei.
"Pensei na saudade que meus pais iria sentir se eu estivesse longe. Não poderia deixá-los, foi o que pensei." disse Clarisse, sem conseguir esconder a amargura na voz e no olhar, agora perdido em uma das telas onde um filme em preto e branco agora era exibido.
"Eu também tinha um namorado, estávamos quase a um ano juntos. Estranho que uma semana depois de perder aquela vaga eu chutei ele quando ele me pediu em casamento."
― Clari. . . ― disse Alex, tentando digerir aquelas revelações.
― Engraçado que até pouco tempo atrás eu lembrava com amargura dessa ocasião e sequer era capaz de entender o motivo de tanto remorso. ― continuou a redatora, ainda com a voz pesada.
Por um momento Alex ficou sem reação àquilo. Seguindo apenas o instinto ela esticou a mão direita, colocando-a sobre a esquerda de Clarisse que pareceu despertar pelo toque, a encarando:
― Chega. Isso já passou. ― disse Alex.
― Isso já, mas. . . ― Clarisse desvencilhou a mão e levantou, para o temor da outra. ― Eu ainda continuo sendo a mesma pessoa covarde daquela vez. Sinceramente, Alex, não sei como sair desse labirinto onde me enfiei.
Antes que pudesse reagir, Alex viu Clarisse desaparecer na escada. A jornalista sequer despediu-se da garçonete sempre simpática e saiu fechando a porta do Vintage com um pouco mais de força do que o necessário. No andar de cima, tendo apenas o som fraco do jazz aos ouvidos, Alex sentou e bateu os punhos com força no tampo da mesa:
― Agora eu estou aqui, sua idiota! ― rosnou ela, frustrada, ao vazio do ambiente acolhedor da cafeteria.

4 Responses so far.

  1. Tão curto, isso é de acabar com o coração dagente. Tantos feels.

    Clarisse e Alex, melhores que muito ship por aí. Tá se garantindo nessa história.

  2. e, meramente por curiosidade, tiveram algum sucesso com o anúncio de fazer parte do KaS? Ver vocês crescendo é bem legal, já que acompanho há tanto tempo.

  3. asdfgh-san says:

    Uow, a Alex foi tão direta que assustou a menina hahaha
    Depois do capitulo anterior bem introdutório, imaginei algum acontecimento de certa importância a seguir e realmente, mais um ótimo capitulo, mostrando alguns dos conflitos da Clarisse, além do dialogo de uma grande sinceridade de ambas, isso foi ótimo e surpreendente de ler.
    Enfim, continuo gostando muito da história!

  4. Anônimo says:

    Cap. Muito legal, agora entendo o q se passa na cabeça de clarisse.

    By :cli-chan

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