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- [Debate] O Dialeto Yuri
Posted by : Mazaki89
quarta-feira, 20 de novembro de 2019
Estava assistindo uma apresentação extremamente interessante
na faculdade de uma veterana que irá apresentar um TCC a respeito de um mangá
que é adaptação de uma obra clássica da literatura japonesa. Bom, o assunto por
si só era bem interessante, mas o que mais me chamou atenção do que ela falou
foi sobre a sua visão de como dividir esse mundo de mangás que não pelos
famigerados e polêmicos Gêneros e Demografias.
Talvez por ser estudante de Letras, mas ela disse entender o
mangá, como um todo, como uma língua e, os diferentes tipos de histórias com
suas características próprias, de dialetos dessa língua. No caso dela isso era
relevante para falar sobre o shoujo sem precisar prendê-lo às classificações de
demografia. Porém, acho que para nós, fãs do yuri, esse tipo de pensamento pode
ser ainda mais generoso.
![]() |
'Murcielago' é yuri? |
Primeiro, vou falar do meu problema com as classificações
tradicionais em gênero e demografia.
Em meios narrativos como cinema, literatura e outros, gênero
costuma ser usado para dividir as tramas em tipos como romance, drama,
ficção-científica, fantasia medieval, young adult e etc. Apesar desse tipo de
organização ser um tanto reducionista (tomando aí o caso de existir uma
polêmica classificação usada por diversos sistemas como livrarias e portais de
conteúdo, o LGBT+ como exemplo mais gritante), existe certa necessidade
mercadológica para a existência de tal método.
Só que, partindo para nosso mundo mais familiar, dos mangás
e animes, é muito comum que as pessoas confundam um pouco as coisas e acabem
chamando de gênero o que na verdade é a demografia. Nisso entram termos bem
famigerados, como shonen, seinen, shoujo e, vejam só, yuri.
Esse tipo de
divisão não leva em conta necessariamente o conteúdo das obras, mas sim o
público-alvo das revistas que publicam mangá, e falar que “um anime é seinen” é
uma afirmação que, tecnicamente
Só que, aí começa meu problema.
Quando alguém fala de yuri, qual é esse yuri ao qual ela se
refere? Se estivermos falando de Citrus, por exemplo, está tudo bem, afinal
Citrus sai na Comic Yurihime, da Ichijinsha, uma revista de demografia yuri,
então está tudo bem.
Mas, Yagate Kimi ni Naru não saiu uma revista Yuri. Nem
Sasameki Koto. Ambos foram publicados em material Seinen. Então, eles são yuri?
Claro que são, todos vamos concordar, mas isso porque nós
sabemos que, ao falar de yuri estamos nos referindo a “histórias de garotas que
amam garotas”, ou, mais especificamente, “a histórias com sentimentos
homorromânticos entre mulheres, em quaisquer níveis ” (se você não sabe sobre
os conceitos de Classe S e homorromantismo, escute nosso Yuricast #17 – Nobuko Yoshiya
e leia o [Debate] Mangá Yuri não é o mesmo que Mangá Lésbico).
E é exatamente aí que entra a complicação do
gênero/demografia. Porque quando vamos falar de yuri, se não especificarmos,
não dá para saber quando estamos falando da demografia yuri e quando é do
gênero (significando aí um jeito específico de contar histórias).
Mas e se aplicarmos a lógica do dialeto?
Mangá é uma linguagem própria, que está dentro do grande
universo dos quadrinhos, mas que tem suas próprias resoluções visuais e
narrativas. Por exemplo, seguindo a classificação de tipos de transição de
quadros de Scott McCloud, os mangás são notórios pelo uso massivo de transições
do tipo “Aspecto a aspecto”, onde vários momentos de uma mesma cena são
retratados em diversos quadros contínuos de uma história.
Então, sendo uma linguagem própria, podemos entender os “gêneros”
shoujo, seinen, yuri e etc, como dialetos dentro dessa própria linguagem, onde
cada um possui seu próprio conjunto específico de “regras de etiqueta do
dialeto”.
Falando de yuri, pense em algo que praticamente todo yuri
tem e que pode ser uma marca de estilo?
Os beijos mais significativos são fora/longe da nossa visão.
Aliás, esse é um senhor aspecto que dá para levantar mil e uma questões, mas vamos
deixar para outro dia.
É o fato de o yuri ter (não apenas esta como outras) várias
características que o diferenciam dentro da linguagem geral dos quadrinhos que
levanta outra vez a questão pra mim tão crucial que é: entender como o yuri é
ao mesmo tempo um dialeto Queer muito próximo às narrativas lésbicas e, ao
mesmo tempo, algo que se diferencia destas. Só com esse entendimento é que
poderemos olhar para o yuri de maneira objetiva para entender o que realmente é
esse dialeto (gênero, sub-linguagem, enfim) e quais são as suas possibilidades.
Eu sei, papo complicado pra caramba. Sou péssima em seguir
metodologia de artigo científico, por isso acabo vindo falar com vocês aqui no
Kono-ai-Setsu dessas coisas bem teóricas e complicadas.
APESAR DISSO, espero que tenham conseguido acompanhar um
pouco do meu raciocínio esquisito aqui. Já tinham pensando sobre “gêneros de
mangá” com nomes de demografias e confundido tudo? É bem normal ver por aí
alguém vendo um anime e dizendo “ah, eu não vejo shoujo” ou “eu não gosto de mecha” (podemos alongar os
exemplos dessa questão ao infinito se quisermos).
Sei que o texto foi curto demais para o tamanho do problema,
mas a intenção do Debate é, bom, criar caraminholas para seguirmos essa vida de
Yurinin (andaram ‘aprovando’ por aí esse nome para os yuristas, possivelmente foi
coisa da Danzetsu no Court). Será que sou a única pessoa que se importa com
essas coisas teóricas?
E, afinal, o que é Yuri?
O significado de yuri já foi feito a muito tempo,
mais, o que eu acho pra mim, nem sempre o outro acha que serve
por isso é bom a gente conversar sobre exctativas e conceitos de tudo