Dar uma definição exata para Strawberry Shake Sweet, talvez
seja limita-lo um pouco, mas o mais justo aqui seria chamarmos de comédia romântica
nonsense. É bem nos moldes de Kaichou wa Maid-Sama (lançado no Brasil, pela
Panini), repleto de romantismo e situações hilariantes. O romantismo é daquele
bem shoujo-ai; gostoso e ao mesmo tempo, enervante. Gostoso porque não tem
pressa em desenvolver a relação afetiva entre as duas garotas, enervante porque
demora pra rolar algo mais intimo, com mais pegada (nesse caso, um beijo, um
amasso) e pior, às vezes nem rola (!!).
Strawberry Shake Sweet é um mangá shoujo-ai, da mangaká Shizuru
Hayashiya, que foi serializado durante longos anos (de 2003 a 2008), primeiro
na revista Yuri Shimai (da editora Sun Magazine), e depois na revista Comic Yuri
Hime (da editora Ichijinsha), logo após a antologia anterior ser descontinuada.
Ao todo são 2 volumes, o que se
justifica por causa da periodicidade da revista Comic Yuri Hime, que no caso é
trimestral. O que é bem normal se tratando de antologias yuris, que fazem parte
de um mercado pequeno. Mas a troca de revista, pouco afetou o conteúdo do
mangá, o mais visível que se nota é a troca de titulo, onde na Yuri Shimai, era
apenas chamado de Strawberry Shake, e claro, o traço acaba sofrendo uma sutil
alteração. Strawberry Shake Sweet que nasceu com a ideia de ser apenas um
one-shote, teve com justiça seu potencial expandido e depois de 5 capítulos
serializados na Yuri Shimai, teve seu valor reconhecido ao ser resgatado para
uma nova antologia. E posso dizer com toda verdade: QUE BOM!!!
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Julia-chan, agora é o "lobo", indo à caça |
Aqui, novamente vamos embarcar no universo das idols
japonesas (já abordado aqui no KaS,
nesse post), sempre retratado de uma forma
extremamente caricata nos mangás yuris (aqui, estou falando da demografia e não
do conteúdo). Então, novamente embarcamos nesse universo caricato, acompanhando
Julia Tachibana, que trabalha para agencia Shanghai Talent Limited. A história
faz uso daquele esqueminha presente em 99% das histórias yuris em geral, onde garota
conhece garota e rola uma paixão ardente. No caso, a Julia é obrigada pelo dono
da agencia, a cuidar e treinar uma nova promessa; Asakawa Ran. Uma garota com
sangue japonês, mas aparência americana, devido ao envolvimento de sua mãe
japonesa, com um americano. Além da aparência, o que mais se destaca em “Ran
Ran”, é sua altura, tanto que ela mais parece uma jogadora de basquete.
Enquanto isso, Julia é pequenina e isso gera não apenas um contraste excelente,
como também situações hilariantes, com essa relação de Senpai e Kouhai.
Clichê, não é? Mas é exatamente essa a intenção. Strawberry
Shake é um mangá que brinca com todos os clichês presentes nas histórias de
shoujo-ai, ao ponto de as personagens quebrarem a quarta parede a todo o
instante. Se você é um fã da Milk Morinaga, sem dúvidas a mais conhecida autora
de mangás yuris aqui no ocidente, com certeza vai notar diversas situações de
puro escracho e zoação. Só faltou mesmo, se passar em um ambiente escolar.
Outro mangá do gênero, que parodia o gênero com certa destreza, é Maria Holic,
mas Strawberry Shake Sweet tem um charme a mais, que é o romantismo.
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Julia-chan quer por que quer, ser a Seme da relação, mesmo que não tenha condições para tal, rs |
Inicialmente, Julia assume um papel de confronto com Ran
Ran. Julia que era tida como o maior nome da agencia, vê seu reinado ameaçado
com a chegada desse novo talento. É divertido ver a ofensiva de Julia para cima
de Ran Ran, enquanto essa, super ingênua e aérea, a admira do fundo de seu
coração, não percebendo as intenções de sua sempai. Mas Julia, rapidamente se
apaixona e cai de amores por Ran Ran, que continua em sem próprio universo
(LOL), continuando não a perceber as reais intenções da sua sempai. Esse é um
legitimo romance entre uma cabeça de vento e uma idiota (!!). O mais gozado
aqui é ver Julia assumindo um papel de Seme (ativo da relação) que não lhe
pertence. É ela que primeiramente nota-se apaixonada pela Ran Ran, e desde
então elabora diversos planos “infalíveis” para ficar próxima de sua kouhai, e
claro, tudo acaba fracassando sempre. E pra piorar, ela ainda não pode contar
com o apoio de sua agente pessoal, Ryoko Saeki, que abomina esse tipo de
relação entre mulheres. Boa parte do mangá, o que vemos é isso, Julia em modo
pervertido LEVEL 5, tentando de tudo pra conquistar e ficar perto de Ran Ran.
Strawberry Shake Sweet é um manga hiper divertido, que me
fez dar altas gargalhadas e relê-lo algumas vezes (algo que não costumo fazer).
É tudo deliciosamente obvio e eles brincam com isso a todo instante. Tanto
Júlia, quanto Ran Ran, são super lerdas e mesmo quando uma declara o amor, pra
outra, a coisa não acontece, não anda. E é divertido, putz! Sensacional.
Confesso que a primeira vez, eu rangi os dentes, pois ainda não havia pegado
qual era o POV do mangá, mas depois que tudo fica claro, é difícil não
resistir. Eles pegam vários clichês e tabus do shoujo-ai, e se divertem com
isso, quase, quase um Gitama. Quando Julia e Ran Ran, finalmente ficam juntas,
numa sequência alucinante e de puro nervosismo, a relação ainda fica estagnada,
porque a Uke da relação (no caso, a Ran Ran) ainda não pegou o jeito certo, e
então as duas ficam apenas de mãos dadas e olhando uma para a cara da outra na
cama (!!!).
O universo em que a história acontece, é quase que
completamente feminino. O editor, é uma figura para lá de caricata e que não
representa nenhum perigo para o “Conto de Fadas Yuri”, e o único personagem
masculino que realmente apresenta uma ameaça, quando se declara para Júlia, é
completamente avacalhado pela autora. Coitado. Só lendo pra saber. O ponto alto
de Strawberry Shake, que são os personagens, também é o pior defeito. Eles são
tão bons, que dá pena vê-los tão subaproveitados. A própria história, pega um
ritmo rápido demais a partir de determinado capítulo e acaba decepcionando um
pouquinho. Havia histórias que poderiam ser mais bem exploradas ali, rendendo
ao mangá uns 3 ou 4 volumes, mas muitas coisas acabam sendo deixadas de lado e
a história principal tendo um desfecho assustadoramente apressado, gerando um certo
anticlímax.
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Não importa o que a Saeki faça, não dá pra conter o apetite sexual de Julia-chan, rs! Morro de rir da Saeki |
Ryoko Saeki foi de longe, a minha personagem preferida na
história. Sua aversão a garotas se relacionando, sua preocupação, como agente
de Julia e Ran Ran e a paixão platônica a qual sua amiga de longa data, Kaoru
Shinjo, sente por ela, tornaram-na extremamente interessante. Suas caras, bocas
e pensamentos, são impagáveis e as tentativas de Kaoru de dar uns “pegas” nela,
são insanas. Acredito que ela merecia um arco próprio, com sua história sendo
desenvolvida. Durante o mangá, é introduzido um grupo de lésbicas, a banda
Zlay, que é uma parodia de uma banda real, a “Glay”, que acabam sendo bem secundarias,
mas nesse caso, sem grande prejuízo. Apesar de que poderiam ter rendido mais. Mas
certamente, é o desenvolvimento de Ran Ran, que mais decepciona, uma vez que
ela é o grande “Deus Ex-Machina” da história, quando o clímax acontece. Mas Shizuru
Hayashiya, resolve pular uma parte essencial, provavelmente pela história ter
que terminar com 2 volumes e as situações acabam soando um pouco forçadas.
Mas se Strawberry Shake Sweet falha no quesito drama,
consegue ser agradável e convincente com o seu romance, repletos de ternura e
um pouco de tensão em algumas páginas. A brincadeira em torno do beijo foi
sensacional, uma vez que beijos é o grande dilema dos mangás shoujo-ai. E
claro, a comédia nonsense é o motor aqui e que faz a história andar
deliciosamente. Vários tipos de piadinhas (como a dos lírios, que é yuri, e das
rosas, que é yaoi), trocadilhos, referências e aquele tipo de humor gag que
muitas vezes só é engraçado para o japonês, por envolver um contexto que não
nos é familiar. Esse mangá é repleto disso, de várias piadas e trocadilhos, que
acabam se perdendo na tradução.
Destaco novamente, a brincadeira em torno dos clichês. Cada
personagem é basicamente um arquétipo das histórias shoujo-ai, que vemos sempre
por ai. A Julia é a sempai, sempre cool. Veterana e conquistadora, mas—OH WAIT,
Shizuru Hayashiya zoa completamente com ela, a deixando como uma garota
desastrada e completamente pervertida (as piadinhas em torno das perseguições
da Julia à Ran Ran são sensacionais; “Quer dizer que você é uma perseguidora?”),
sempre rompendo em hemorragias nasais quando fica fantasiando ou é abraçada por
Ran Ran. Enquanto isso, Ran Ran é construída como a típica “donzela” yuri; aquele
lírio puro, branquinho, imaculado e ingênuo, mas é completamente destruída no
processo. Começando pelo seu character designer, que é completamente inverso ao
que intendemos como garotas Uke. Ela é altona, alheia a tudo que se passa ao
seu redor e não percebe as aleatoriedades de Julia, sempre soltando fluidos
(HOHOHO) por tudo que é orifício por causa dela. Em meio aquele universo de
contos de fadas, com todas as personagens sendo lésbicas, encontra-se Ryoko
Saeki, completamente frustrada e revoltada com aquilo tudo.
Strawberry Shake Sweet é uma comédia shoujo-ai, repleta de
humor pastelão e romance, que merece ser apreciado. Principalmente, por ser um
dos mais populares (como se mostrou
aqui numa enquete realizada, sobre os 100
mangás yuris mais pops até o ano de 2010). A arte é excelente e foge completamente
do senso de realidade e adequada a cada situação presenciada no mangá. Shizuru
Hayashiya coloca aqui uma arte bem limpa, agradável e com uma escrita excelente.
Você lê o primeiro volume e instantaneamente, quer devorar o resto. Os layouts
tem um fluxo de leitura excelente, com uma ótima disposição para cada quadro. O
problema é a presença em diversas páginas do formato yonkoma. Como eu não
sabia, quando peguei pra ler, eu fiquei bastante confusa. Mas não é nada que
atrapalhe o ritmo de leitura, só causa um pouco de estranheza inicialmente, já
que se trata de um mangá convencional. O timing da Shizuru Hayashiya para o
humor é excelente, seja nas reações estabanadas de Júlia quando está perto de
Ran Ran, ou no excelente tom sarcástico de Saeki.
Hayashiya consegue captar de forma incrível cada expressão
dos personagens, seja a inexpressividade, fraqueza emocional, delírios yuri, tudo
leva ao riso frouxo. A paródia em torno do grupo Zlay, uma banda de visual key,
formada por garotas excêntricas e lésbicas, são sensacionais, por ficarem a
todo o momento cutucando o leitor yurifag (“Mulher que é bão, eu quero é mulher
com mulher”) e abusando dos clichês (jamais me esquecerei, de uma delas
dizendo: “Eu já fui vítima de dois perseguidores. Um homem e uma mulher. O
homem, eu espanquei e depois chamei a policia. A mulher, eu levei pro meu
apartamento e fizemos amor”). Se ainda não conhece Strawberry Shake Sweet, esse
é o momento.
Autora: Shizuru Hayashiya
Volumes: 02
Gênero: Comédia/ Romance/ Parodia
Demografia: Shoujo-ai
Ano: 2003/2008
Onde Encontrar: Aino Scalantion